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Quando Lisboa Tremeu - Domingos Amaral

Antes de começar a fazer a resenha é bom que todos saibam que a base da história é baseada em um fato real. Realmente ocorreu um terremoto seguido de um tsunami em 1755 em Lisboa, a magnitude desse terremoto foi 9 na escala Richter, para vocês terem ideia, essa foi a mesma magnitude do terremoto que ocorreu no Japão ano passado. Estima-se que morreram 10 mil pessoas nesse acidente natural, isso sem contar que Lisboa foi devastada e ficou dias sob incêndio, pois não existiam pessoas para apagar o fogo.

O livro Quando Lisboa Tremeu é tão bem elaborado e escrito que será difícil resenhar. Domingos de Amaral conseguiu pegar bem a essência de como as pessoas devem se sentir em uma situação desse e como foi realmente a reação deles naquela época.

A história é forte e não teria como não ser, imaginem uma cidade completamente destruída em poucos segundos, é assustador, os que sobrevivem se sentem perdidos e não conseguem imaginar o por quê da terra de tremido.

E depois, cheirara aquele odor horrível de carne humana tostada, ouvira os gritos lancinantes e vira as labaredas subindo, forçada a assistir àquele solitário inferno terrestre que, no entanto, era capaz de entreter tanta gente. Pasmara-a ver gente que soorria para afastar o medo, gente que cuspia para se ver livre da repugnância que morava no fundo da garganta, gente que, não sabendo nada sobre o que o infeliz fizera, considerava que se ele morria queimado era porque certamente merecia! p.11

Nos personagens Domingos caprichou, digamos que nenhum deles presta, todos possuem algum segredo escondido e tenta de todos os modos manipular os acontecimentos de um modo que os favoreça, sem se importar que outras pessoas também estão passando pelos mesmos problemas.

Os habitantes de Lisboa perdem a noção e, como em qualquer outra catástrofe, os homens retornam as suas origens e viram animais, tendo saques, violência, estupro e tudo de ruim que você possa imaginar. As cenas muitas vezes são tão fortes que temos até dificuldade de lembrar que a história se passa em 1755.

A narrativa é maravilhosa, envolvente e forte, não dá vontade de largar o livro, sentimos uma aflição e vontade de berrar, sair correndo e se desesperar junto com os nossos personagens.

A maioria das pessoas estava nua. Homens e mulheres e crianças sem nada em cima da pele, só poeira e sangue e terra. Andavam sem falar, só gemendo, em pânico. Os olhos eram o mais impressionante: alucinados, fitando o vazio, sem verem os outros, sem verem nada a não ser o horror das imagens de momentos antes. p 57
A única pessoa realmente boa no livro é a criança, acho que para mostrar a inocência e fé que as pessoas possuem e vão perdendo conforme vão envelhecendo. De certo modo, ele é o causador da união de todos os outros personagens que só pensam em fugir de toda aquela situação.

Uma coisa bem interessante é que o Amaral em certos momentos adiciona um pouco de misticismo dos escravos da época e não explica se aquilo realmente aconteceu ou não. Como o livro é narrado na maior parte em primeira pessoa, vemos a visão do pirata mais azarado que eu já vi.

Quase me esqueço do toque de humor do livro. Um dos personagens é um viúvo muito do safado que veio da Inglaterra, ele vive a um bom tempo em Lisboa, mas não conseguiu perder o sotaque, resultando em uma fala bem esquisita e confusa:

-Deus curioso, you God! Todo dia, everyday, padres everywhere! Today, terremoto, sofrimento, not one priest! Nem um, damn! Where are eles, quando we need  p.61

O final é surpreendente, depois de tanto sofrerem coisas boas acabam acontecendo e você quase não consegue acreditar de como o mundo pode ser pequeno, em como catástrofes podem levar a conclusões lindas para todos.

Domingos de Morais está de parabéns com esse livro, conseguiu construir uma história nada cansativa como tantas outras históricas que vemos por ai.

Havia quem puxasse corpos pelos pés, arrastando-os pela praça, sem perceber que destino lhes dar. Havia mulheres coxas, que gritavam de dor ao andar, usando traves cheias de pregos como bengalas. Havia homens deitados no chão, sangrando e gritando, que pareciam loucos, fazendo gestos rápidos, como se estivessem afastando as moscas no ar, mas que só combatiam as terríveis visões que lhes povoavam a mente. Havia crianças, sem pernas ou sem braços, e até sem cabeças.p 83


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